O caso da Americanas, um divisor de águas do mercado, completou um ano. Lembrar do escândalo pode trazer muitos aprendizados. E revisitar o fato, do ponto de vista de uma profissional da área de Relações com Investidores, joga luz na responsabilidade que os RIs têm em momentos críticos como este, já que são a ponte entre mercado e a empresa.
O episódio abalou os alicerces do mercado e gerou incerteza entre os investidores, além de abrir uma discussão contábil para não somente empresas de varejo, mas diversos outros setores que usavam o mesmo critério contábil.
O passivo da companhia chega a R$ 42,5 bilhões e a receita líquida consolidada é de R$ 25,8 bilhões em 2022, último período reportado. Em momentos de crise como esse, o papel do RI torna-se crucial na restauração da confiança e na gestão da comunicação com todos os que fazem parte do mercado.
A descoberta de irregularidades financeiras levanta sérias preocupações com relação à integridade corporativa. O RI desempenha um papel vital na navegação dessas águas turbulentas, oferecendo informações transparentes, precisas e oportunas para dissipar incertezas.
A comunicação é a chave em momentos de crise. O RI deve assumir a liderança na formulação e alinhamento interno de uma estratégia de comunicação eficaz. Isso inclui a divulgação imediata de informações relevantes, garantindo que o mercado esteja atualizado e consciente das ações corretivas em andamento.
A manutenção do relacionamento com o mercado é vital. O RI precisa antecipar perguntas, oferecer esclarecimentos e fornecer atualizações regulares sobre as medidas corretivas. Essa abordagem proativa é fundamental para evitar especulações prejudiciais e manter e/ou restaurar a confiança dos de todos os stakeholders.
Seguindo essa linha, a transparência é a moeda mais valiosa em tempos de crise. O RI tem que adotar uma postura aberta, reconhecendo os problemas, apresentando um plano de ação claro e demonstrando compromisso com a correção das irregularidades. A prestação de contas é essencial para reconstruir a confiança perdida. Ter uma comunicação transparente e encarar os fatos de maneira direta são estratégias valorizadas pelo mercado e fazem com que a crise reputacional seja menor, ou, pelo menos, podem enxergar o valor de ser transparente.
Em momentos de dúvidas e possíveis irregularidades, a cooperação total com órgãos reguladores é essencial. É papel do RI facilitar a comunicação transparente com essas entidades, garantindo conformidade e demonstrando a disposição da empresa em corrigir suas práticas. Além disso, uma auditoria externa independente é prioridade para validar as ações corretivas e restaurar a integridade financeira.
Voltando à Americanas: a restauração da credibilidade da empresa será um processo contínuo. O plano de recuperação judicial, aprovado em dezembro de 2023 por representantes de 97% das dívidas, indica que o fim do processo seria em 2026.
Neste cenário, o RI deve liderar esforços para implementar práticas robustas de governança corporativa, reforçar controles internos e promover uma cultura de ética e de responsabilidade.
Em tempos de crise, o RI emerge como um farol, guiando a empresa para águas mais seguras. Ao adotar uma abordagem transparente, proativa e colaborativa, o profissional desempenha um papel fundamental na restauração da confiança do mercado e dos investidores. Empresas que passaram por grandes escândalos podem ter a oportunidade de renascer, mais fortes e resilientes, com um compromisso renovado com a inteligência corporativa.
Melissa Angelini é diretora de Relações com Investidores e membro do conselho de administração do IBRI